POESIAS
Mão Preta
Tijolo posto
Por ordem de um arquiteto,
Mas o teto
ele não sabe levantar.
Edifício enorme
que de longe se enxergue
quem ergue?
Mão preta!
Escudo de preto
Na linha de frente dos palácios
Ricaços curtem a festa
A desritmada dança e a segurança, quem faz?
Mão Preta
Quitutes, sobremesas, manjares
Quem é que fazer?
Experimenta por dona Bia na cozinha
não conseguiria
Mesmo sendo nutricionista
Especialista na cozinha,
tem mão Preta
O anel com pedra de diamante
Pro evento de debutante de sua filha
quem que extraíra?
No minério seu império
Nada seria
Se lá na mina, na gruta
A luta pra remover a pedra
na caverna escura
escura também a sua pele
Mão Preta
Quem que te leva em segurança,
Que pega as suas crianças,
Os filhos dos Bitencú
Aqueles capeta
Seus caminhos quem conduz?
mão Preta!
A engrenagem dos trilhos,
O alpiste dos seus passarinhos,
O depósito do seu cheque,
O paletó na lavanderia do seu chefe,
O eletricista do abajur do seu escritório,
Quem que cava a cova do seu velório?
Contabiliza!
Se por um dia a mão preta, pare-se
Se afasta-se dos serviços
(Risos)
Porque a gente movimenta esse lugar
Vivemos um crime social
E na moral
Você não paga o meu salário a movimentação do monetário
É o meu suor a percorrer
que faz pagar
A casa grande entrará em choque
Quando em seus estoques
não tiver mais Mão Preta
Pra puder cuidar.
Metade de mim desespera
Metade de mim diz, espera.
A Bença Mãe
Sobre minha cabeça grãos,
Movimentos sublimes,
Mãos firmes,
a me cuidar
O canto Yorubá
De segredos que não ei de perguntar
Amarelo, verde, marrom e preto
Sob pratos brancos
Um banho de sementes
que de correntes
Viera me libertar
Iya, seu bailado na dança
Mostra abundância
Na herança
Que carrega
Nega veia
Mãe, mulher, militante.
Defende a todo instante
Cultura sua!
Seu bailado um reinado
de graciosidade
Sensualidade de Osun
destreza de Ogum
E não tem nenhum
Homem na terra
com força igual você,
Pelos cuidados me ofertado
Só agradeço
Pela divisão do fardo
Se depois do encantamentos descritos
Enxergarem perigo
na filosofia de vida
Não há mandinga
que fará mudar
Preciso exterminar preconceito,
pisar no terreiro
e se permitir.
E se ainda assim
Preconceito houver,
Nem Jesus na causa,
Só resta abrir mão
Caminhos, e lavar a alma.
O Levante
Do que me importa sua ditadura da beleza
Trago em meu sorriso
Soberana realeza
Os atabaques soam das minhas mãos
As mesmas que provêm o pão
A percussão não é restrita só ao homem
das mãos das mulheres se tem valia
Porque desde os tempos da África
Que o tambor batia
Pelas mãos dessas guerreiras
Maculelê, Jongo, Samba de Coco, Capoeira
E se cambaleio sem muito saber me encontrar
quando ouço o atabaque
que me faz serenar
Daí vem a certeza
Que o leite materno do seio da mãe negra
não foi só o que me fez alimentar
das suas entranhas sai
e o meu choro se fez canção
entoavam em meu choro
pulsação
de dores que mares me trouxe
Sou resistência de açoites
Me ergo
Renovo
Nzinga menina eu!
Que sobreviveu
a gerações de tortura
e não me venha com sua ditadura
me fazer regressar
Eu sei de onde vim
de onde tudo começou
e se na história não me vejo
Me reascendo no fogo
que afina o couro do tambor
Identidade Negra
Não me chame de crioula
porque eu posso interpretar
que você é meu senhor
querendo me abusar
Parda não é normal
porque não sou filha de pardal
E morena o que seria?
Uma nova etnia?
Pra mim uma palavra sem classificação
então me chame de negra
porque sou filha de negrão
---
Metade de mim desespera
Metade de mim diz, espera.
Levanta Preta!
Levanta Preta
Levanta a cabeça
Porque não dá tempo pra lamentar
Enquanto chora as chagas do coração
Há os meninos querendo sair pelo portão,
e a roupa pra lavar
A roupa tá lavada e precisa ser estendida
e depois de estendida
Tira pra chuva não molhar
A chuva de Oxalá
Vem
Deixa elas também seu corpo tocar
Levanta a cabeça preta
Porque o turbante fica melhor
enaltecido
E saiba que o que aconteceu contigo
Não é a primeira vez no mundo
e nem a última será
Díspar
Enquanto desliza as águas a banhar
Quando toca o ori
refrigera pensamentos
e descendo
pela face mistura com as águas dos olhos
Nos poros faz carícias
E é por isso que precisa
deixar banhar
Levanta a cabeça preta!
Porque a coroa com teus cachos
Eu não só acho,
mas tenho certeza
Que toda sua realeza
Não combina com essa tristeza
e que você só mereça
Os raios de sol
que tem o teu sorriso
E que amar é preciso
Se não for machucar
Preta
Há uma continuação de teu reinado
que do seu ventre fora gerado
Então joga no chão esse fardo
E sorria!!!
Porque de novo se fez dia
e tens a chance de recomeçar
Mãe Autônoma
Impressionante o quanto
A guarda dos filhos é da mulher
Ora se não é?
Quando há a separação
quem que fica com a prestação
do inalador
que não sara a dor dessa ferida
Fica aberta
Pingando sangue
E se não fosse o bastante
A saúde mental da mulher
Sofre
Porque ela a todos socorre
Mas não há quem
cuide de suas feridas
Internas, físicas, psicológicas
Numa separação
não existe pai que proponha
Guarda compartilhada
É a mãe que fica com toda a carga
Ela já não tem mais
Tempo pra produzir
pra se cuidar
uma vida social
uma amiga que levante seu astral
Uma viagem pro litoral
um bom livro na sua prateleira arsenal
Um churrasco sem crianças no quintal
Seu dinheiro
é pra todo é pra suprir o financiamento familiar
Pra contas a pagar
Ja não sabe mais o que é cabeleireiro
Nem fazer a unha
Mas o que mais a tortura
é o descaso
esse não dividir o fardo
De um fruto que outrora
Era o melhor plano dos dois
De nós
após
Só os nós
que a mãe autônoma tende a desatar
Dinheiro da pensão
não paga a ausência
a ciência de que o primeiro passo
Passou e não se viu
O dente caiu
já nasceu
E você nem olhou
o choro gritou
e também em seu peito
Éramos nós 3 querendo leito
E o desespero é tanto
que chora filhos de um lado
É a mãe num outro canto.
Num entanto, tem um tanto de roupa no tanque
pra exercer
tem a matéria dos filhos pra resolver
Tem o almoço pra fazer
tem que providenciar a mistura pra comer
Já pagou a conta de água, de luz, de telefone
Agora chega e da TV
Deu o horário de levar os meninos na escola
Aproveita leva uma sacola
e passa no mercado
Acabou o leite e o achocolatado.
Ai meu Deus o agasalho não serve mais
O aluguel tá pesado
Mas não da pra voltar pra casa dos pais
Ela equilibra
tudo isso com duas mãos
com um coração
que ainda pinga sangue
Mas seus filhos a todo instante
é com ela que contam
que sabem que tem refúgio
enquanto fugo dos prazeres
tento fingir que os afazeres
são meus dotes
mas o bote virou já faz tempo
vejo o quanto mãe
é terra firmamento
só hoje entendo
o que enfrentou minha rainha
quando nos preparou gororoba com farinha
Na falta do pão
macarrão
nunca houve filé mignon
Pra cada mãe se deve uma estatueta
Toda mãe na devesa do filho é porreta
enfrenta as treta
e põe sorriso nos lábios
Faz acontecer o milagre multiplicar
é por isso que no coração de mãe sempre há
Mais um espaço
que é maneira de tapar buracos e sentir-se importante
toda mãe e um diamante
Toda mãe vale ouro
em seu mais alto quilate
agora tem pai
que só late, achando enriqueceremos com o dinheiro da pensão
que com seu pouco dinheiro, tudo será provido
Há diferença é que mãe e pedra preciosa
e tem pai
Que só é um caco de vidro.